Bordeaux e a História da França, Parte 2

Como citei na Primeira Parte sobre Bordeaux, esta é a segunda parte, onde tem mais da história dessa cidade que tal como Rouen tem sua história atrelada ao Reino da França e da Inglaterra.

Museu Nacional da Alfândega de Bordeaux

Após sair da Cidade do Vinho, fiz uma parada rápida para almoçar um lanche (nada sofisticado, preferi a praticidade e rapidez), parti então para o Museu Nacional da Alfândega, que é um museu bem pequeno, porém existem muitas informações históricas desde antes da Revolução Francesa até o presente.

O Museu foi criado em 1984, portanto, neste ano de 2019, completa 35 anos de história.

As Douanes, ou Aduanas, em português, nada mais são do que as Alfândegas por onde os produtos eram tributados e ainda são, a de Bordeaux é uma das mais antigas da França.

A História das Alfândegas

As alfândegas existem há milênios, pelo menos desde a Era Romana, afinal com o Império crescendo era necessário controlar as mercadorias e arrecadar impostos para o Governo.

Sendo assim, as Aduanas podiam controlar as mercadorias no mercado interno, para que não fosse exportado o que seria essencial para a nação.

No século XVII, Jean-Baptiste Colbert, controlador-geral das Finanças, de Louis XIV, um dos principais ministros do Reino, é considerado o pai da Alfândega Moderna, foi nessa época que a França começou a aplicar em todo seu território a tarifação em mais de 40% dos produtos que entravam ou saíam do Reino.

Da criação, em meados de 1.680, até a Revolução Francesa, portanto, cerca de 100 anos de história, a Alfândega Francesa fazia parte da Ferme Générale ou Fazenda Geral, que centralizava o recebimento de impostos de toda a França.

Após o Antigo Regime

Durante a Revolução e o Primeiro Império, a Ferme Générale, foi suprimida e um novo serviço foi criado Régie des Douanes Nationales, o Conselho Nacional da Alfândega, que se tornou uma espécie de Polícia do Comércio Exterior, mas manteve os mesmos funcionários, portanto, o termo correto seria que houve apenas a renomeação do órgão responsável.

Na época do Primeiro Império, a Duana Francesa esteve presente em mais de 130 departamentos, com mais de 35 mil funcionários, inclusive nos Estados Satélites, como Roma, Piémont, Genève, dentre outros. Afinal, em alguns períodos o Império Napoleônico ocupou grande parte da Europa, além dos territórios fora da Europa.

No Século XIX, permaneceu organizado como era durante a “Ferme Générale”, com dois tipos de funcionários, o burocrático, que era menos numeroso, porém muitas vezes mais favorecido e os ‘brigadistas’, que representava a maior parte dos funcionários e eram organizados de forma militar, sendo os primeiros mais sedentários e os segundos muito mais ativos.

Ainda no Século XIX e começo do Século XX, durante o Imperialismo, onde houve a colonização da África, Oceania e da Ásia, foram instaladas alfândegas nessas áreas, porém eram independentes da Alfândega Francesa.

Contexto atual

Após a Segunda Guerra Mundial, a Alfândega Francesa, assim como os demais governos e alfândegas pelo continente iniciam a ‘unificação’ que permanece até hoje, por meio da União Europeia, que inicialmente teve justamente essa função, unificar o Mercado Econômico, com origens na Comunidade Econômica Europeia (CEE), formada por seis países: Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Países Baixos. E desde então outros 22 países aderiram ao mercado comum.

Hoje a União Europeia, além do Mercado Comum com união aduaneira, portanto, os membros possuem livre circulação de mercadorias, possui outros atributos, sendo uma união política também, embora cada país continue independente e soberano sobre muitas questões.

Conclusões

Apesar de ser um Museu pequeno, para quem quer ver um pouco mais da história é uma ótima pedida para conhecer, em especial pelos objetos com valor histórico. Por estar incluso no Bordeaux CityPass, torna a visita extremamente barata, se souber aproveitar o passe e muito interessante.

Monumento aos Girondinos de Bordeaux

Saindo do Museu Nacional da Aduana, eu resolvi andar meio que sem destino específico, mas em direção à Catedral, encontrei então o Monumento aos Girondinos, em homenagem aos deputados girondinos que foram mortos durante o Período do Terror, na Revolução Francesa.

É um lindo monumento que foi erguido entre 1.894 e 1.902, conforme algumas fotos:

Após apreciar a beleza do monumento, voltei a andar, mas agora com destino à Catedral de Santo André.

Catedral de Santo André de Bordeaux

Existem registros históricos que comprovam que antes da atual catedral outros edifícios católicos estiveram no mesmo lugar, mas que foram destruídos em razão das invasões ocorridas no período medieval, como os Visigodos, no Século V, os Sarracenos no Século VIII e os Vikings no Século IX. E a igreja foi sendo reconstruída nessas ocasiões.

O Papa Urbano II, quando estava de passagem pela França, em razão de uma Cruzada, em 1° de Maio de 1.096 consagrou a Catedral.

A Catedral atual foi construída entre o Século XII e XVI, segundo o Governo Francês, com a construção principal entre os séculos XII e XIV, com o Portal Real, no Século XIII, e a Torre Pey Berland no Século XVI.

Já no Século XIX, foram feitos os anexos da Catedral, os vitrais e afrescos com inspiração medieval.

Alguns eventos de relevância na história francesa, direta ou indiretamente, ocorreram na Catedral de Santo André, tais como:

  • Casamento de Aliénor, (Leonor) Duquesa da
    Aquitânia com o então futuro Louis VII (com mais detalhes abaixo), em 1.137;
  • Batismo de Ricardo II, então futuro Rei da
    Inglaterra, em 1.367;
  • Casamento de Louis XIII com a infanta espanhola
    Anna d’Áustria, em 1.615;

História de Bordeaux e da França

A Região da Nova Aquitânia, possui registros de presença humana (Neandertais) desde pelo menos 40 mil anos.

Porém os primeiros registros históricos de ocupação efetiva da região que se tornaria a Cidade de Bordeaux data do século VI antes de Cristo (possível consultar aqui) , portanto, há mais de 2.500 anos.

A região foi conquistada por Publius Crassus, durante as Campanhas de Julio César na Gália, que a integrou ao Império Romano, pelo que consegui pesquisar, somente a partir dessa época é que a cidade de Burdigala, como era conhecida pelos Romanos começou a se desenvolver efetivamente.

Uma cidade Romana

Foi utilizada principalmente como Emporium, ou seja, um porto Romano, que ajudou fortemente para desenvolver a cidade de Bordeaux ao longo dos próximos séculos, o que ajudou a cidade a progredir dentro do Império, passando de civitas stipendaria (algo como Cividade Estipendiário), o tipo mais baixo e mais comum de cidades e comunidades durante o Império Romano, no Século II, desbancou a cidade de Saintes (então chamada de Mediolarum Santorum coo Capital da Aquitânia II, uma das três regiões que o Império Romano nomeou como Aquitânia.

O cultivo da uva, para produção de Vinhos, principal produto de exportação de Bordeaux começou nesse período inicial do domínio Romano na região.

Nos séculos seguintes, Bordeaux continuou a crescer em importância, no Século VIII, Carlos Magno, transformou a Aquitânia em um Reino, ligado ao seu Império, e Bordeaux se tornou a cidade mais importante desse Reino.

Bordeaux: Uma Cidade Francesa, mas sob Domínio Inglês

Em 1° de Agosto de 1.137, Aliénor, (Leonor) Duquesa da Aquitânia (o Reino já havia sido dissolvido há algum tempo) se casou com o Louis VII, Rei da França, na Catedral de Saint-André.

Porém o casamento foi dissolvido em 21 de Março de 1.152 e em 18 de Maio de 1.152 (ou seja, dois meses depois) se casou com Henrique Plantageneta (Henri Plantagenêt), Duque da Normandia e Conde d’Anjou que dois anos mais tarde, no Natal de 1.154 foram coroados Rei e Rainha da Inglaterra, em Londres.

Já no natal de 1.156, Henrique II, da Inglaterra retornou aos Ducados Franceses para que seus vassalos lhe prestassem homenagens e isso foi o início, ainda que informal dos eventos que se desenrolaram para o início da Guerra dos Cem Anos.

Em 1.204, o Rei Phillipe Auguste (o mesmo que ajudou a fortificar o Monte Saint Michel, retomou o controle do Ducado da Normandia, Anjou e Saintonge, destituindo o Rei Inglês de domínio dessas regiões, porém na Aquitânia permaneceu sob domínio inglês.

Em 1.453, após três séculos de Domínio Inglês sobre a Região, Carlos VII, Rei da França, conseguiu uma vitória na Batalha de Castillion, em 17 de Julho de 1.453 a Guerra foi finalmente terminada, após 116 anos e as regiões antes ocupadas pelo Reino Inglês voltaram para a Coroa Francesa, conforme um acordo de trégua realizado em Outubro de 1.453.

Apenas com o Tratado de Picquigny, assinado em 1.455 que a Guerra oficialmente terminou.

Bordeaux: entre a Reconquista e a Revolução.

Com a reconquista francesa, ao menos 2.000 habitantes saíram de Bordeaux em direção à Inglaterra, numa época em que a população não tinha mais do que poucas dezenas de milhares.

Em 1.462, Louis XI decidiu instalar um Parlamento em Bordeaux (em 1.789, existiam cerca de 13 parlamentos ao longo do Território da França), ou seja, essa medida fez com que a importância de Bordeaux fosse elevada.

Esse, além de outros fatos transformaram a cidade num dos importantes polos culturais e também pontos de revoltas, após Paris, a mais explosiva.

A economia cresceu de forma substancial e com isso o crescimento populacional quase dobrou em menos de um século, passando de 66 mil para mais de 110 mil habitantes.

Na véspera da revolução, Bordeaux era o porto mais importante da Europa Continental, e na classificação mundial, perdia somente para Londres, o que tornava a cidade um ponto vital para o comércio.

Após Revolução até os dias de hoje

Parte considerável da população apoiou o Golpe de 18 Brumário, em 9 de novembro de 1.799, que levou Napoleão ao poder como Primeiro Consul.

Por algum tempo, Napoleão foi extremamente popular em Bordeaux, perdendo um pouco ao longo dos anos, em especial durante as Guerras contra a Espanha, entre 1.807 e 1.810. Sendo que Bordeaux foi a primeira cidade a apoiar o retorno dos Bourbon ao poder.

A cidade ao longo do século XIX, alternou momentos de apoio a monarquia (Império, Reino e Império novamente) e a República.

Durante a Primeira Guerra Mundial, a cidade foi a Capital provisória da França por alguns meses, entre setembro e dezembro de 1.914.

Hoje a cidade é uma das 10 maiores cidades da França, no quesito população, com mais de 240 mil habitantes.

Conclusão

Bordeaux é uma cidade linda, com história incrível e que definitivamente merece ser visitada por todos, amantes ou não do Vinho.

Pois essa cidade não se resume a este único produto, mas sim a toda a história que está envolvida.

É um destino que quando puder voltarei e por mais tempo do que apenas as poucas horas que eu tive, que deu para conhecer apenas superficialmente a beleza e majestade de Bordeaux.

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